ESTUDO
REFERENTE À COBRANÇA DE VALORES NÃO DISCRIMINADOS EM FATURA TELEFÔNICA Algumas
concessionárias do serviço de telefonia não apresentam suas faturas telefônicas
de acordo com o que preconiza a Lei. Por
esta razão foi realizado o presente estudo, tomando por base as faturas da
Brasil Telecom, uma das concessionárias de telefonia fixa que atende o
estado do Paraná e apresenta as faturas telefônicas de forma ilegal. Um
dos serviços que são apresentados de forma ilegal é o intitulado de
“serviços locais”, faltando elementos que comprovem a utilização dos
serviços e a legalidade dos valores cobrados. Conforme
será a seguir demonstrado, a cobrança de valores não discriminados na
fatura telefônica é ilegal, não podendo persistir. DA
IMPOSSIBILIDADE DA COBRANÇA DOS VALORES NÃO DISCRIMINADOS NA CONTA TELEFÔNICA A
cobrança de valores não discriminados em conta, notoriamente referentes às
ligações locais, está em desacordo com o Código de Defesa do Consumidor,
artigo 6º inciso III, com a Lei 9472/97, artigo 3º, inciso IV e ainda com
a Lei Estadual 13051/2001 artigo 1º, cujos teores transcrevemos, in
verbis: Código
de Defesa do Consumidor: “art.6º
São direitos básicos do consumidor: III
– a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços,
com especificação correta da quantidade, características, composição,
qualidade e preço, bem como sobre os riscos que apresentem;” Lei
9472/97: “Art.
3° O usuário de serviços de telecomunicações tem direito: IV
- à informação adequada sobre as condições de prestação dos serviços,
suas tarifas e preços;” Lei
Estadual (PR) 13051/2001: “Art.
1º. Fica a empresa concessionária de serviço público de telefonia fixa
no Estado do Paraná, responsável pela emissão da fatura telefônica,
obrigada a individualizar cada ligação local realizada pelo consumidor,
fazendo constar na fatura as seguintes informações: a)
data da ligação; b)
horário da ligação; c)
duração da ligação; d)
telefone chamado; e e)
valor devido. §
1º. Entende-se por ligação local, aquelas denominadas genericamente por
pulsos pelas empresas concessionárias de serviço público de telefonia
fixa. §
2º. A empresa concessionária de serviço público de telefonia fixa, também
fica obrigada a colocar a quantidade de pulsos efetuados no mês atual de
cobrança e quantidade dos últimos doze meses” Assim,
em que pese a conduta da empresa telefônica estar amparada por portaria
expedida pelo Ministério das Comunicações, revela-se ilegal e arbitrária
a cobrança dos valores não discriminados, vez que fere a hierarquia das
normas, não sendo, portanto, possível a cobrança na forma que atualmente
se apresenta. Ressalte-se
que a cobrança, na forma que é feita atualmente, fere diversos princípios
de nosso ordenamento jurídico, dentre eles: Princípio
da Dignidade da Pessoa Humana:
Celso Bastos[1] ensina que: “A
referência à dignidade da pessoa humana parece conglobar em si todos
aqueles direitos fundamentais, quer sejam os individuais clássicos, quer
sejam os de fundo econômico e social.” A
tutela de direitos pressupõe que seja respeitada a dignidade do homem. O
Estado precisa tomar providências para que condições mínimas de vida
digna sejam concedidas às pessoas. Não adianta adotar um ordenamento jurídico
avançado se o personagem principal é deixado à sua própria sorte. A
preocupação do legislador constituinte foi a de que o Estado
proporcionasse condições para que todos tivessem o direito de ter uma
existência digna. Assim
o consumidor, ao ser exposto a uma situação ilegal, tem sua dignidade
diretamente atingida. A dignidade é um valor espiritual e moral, inerente
à pessoa, que se manifesta singularmente na autodeterminação consciente e
responsável da própria vida e que traz consigo a pretensão ao respeito
por parte das demais pessoas. Princípio
da Boa Fé Objetiva:
trazemos o conceito dado por Miguel Reale[2], cujo teor demonstra sua
importância e relevância ao presente caso: “a
boa-fé objetiva se apresenta como uma exigência de lealdade, modelo
objetivo de conduta, arquétipo social pelo qual impõe o poder-dever de que
cada pessoa ajuste a própria conduta a esse arquétipo, obrando como
obraria uma pessoa honesta, proba e Leal” Não apenas em nosso Código Civil, mas inclusive em outros corpos legislativos o princípio da boa fé objetiva também foi absorvido, a exemplo do Código de Defesa do Consumidor, ex vi artigo 51, inciso IV[3]. Serve também como meio de interpretação dos negócios jurídicos, v.g. artigo 113 do Código Civil de 2002[4], que não possui correspondente no de 1916, no exercício de direitos e como
norma de conduta para os contratantes. Estatui o artigo 422 do Código
Civil, como uma cláusula geral: “Art.
422. Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do
contrato como em sua execução, os princípios da probidade e da boa-fé.” Os
principais deveres decorrentes deste princípio são: os de cuidado, previdência
e segurança; os de aviso e esclarecimento; os de informação; o de prestar
contas; os de colaboração e de cooperação; os de proteção e cuidado
com a pessoa e o patrimônio; os da omissão e de segredo. Cada um se adapta
e insere conforme o tipo de contrato idealizado e concretizado pelas partes. Essa
análise nos leva à conclusão de que o contrato, além de servir como meio
de se atingir o interesse pessoal de determinadas pessoas – com suas
prerrogativas individuais e egoísticas –, também está sujeito a uma
intervenção tácita ou expressa do Estado na tentativa de procurar atender
as finalidades sociais. A
não observância ou a deslealdade configura ato ilícito ou abuso de
direito, de acordo com o artigo 187 do diploma civil: “Art.
187.Comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede
manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela
boa-fé ou pelos bons costumes.” Princípio
da Proteção dos Direitos do Consumidor: enquanto
princípio da Constituição Econômica Formal, este princípio estabelece
que os consumidores, por serem partes mais frágeis nas relações de
consumo, deverão ser amplamente protegidos de possíveis lesões causadas
pelo abuso, ilegalidade e demais atos lesivos praticados pelas prestadoras
de serviço e por fornecedores de produtos. Princípio
da Transparência:
segundo Rogério Ferras Donnini, este princípio, que está inserido no art.
4º do CDC: “...tem
por finalidade a realização de um contrato celebrado com respeito e
lealdade e, como conseqüência uma relação mais justa e sincera. Transparência
significa informação clara e correta sobre o produto a ser vendido, sobre
o contrato a ser firmado, significa lealdade e respeito nas relações entre
fornecedor e consumidor, mesmo na fase pré-contratual, isto é, na fase
negocial dos contratos de consumo". Como
restou demonstrado no caso sub judice, a Empresa-Concessionária não
especifica pelo que está pagando o consumidor, impedindo-o verificar o que
está sendo gasto. Desta maneira, fere o princípio da Transparência nos
Contratos nas relações de Consumo, deixando em opacidade as cobranças não
discriminadas. Corroborando
com este entendimento, valiosa trazer a posição firmada pela Turma
Recursal Única dos Juizados Especiais do Estado do Paraná sobre a questão
ora proposta, vejamos: “EMENTA
: NULIDADE DE COBRANÇA. "SERVIÇOS LOCAIS" NÃO
DISCRIMINADOS
NA FATURA TELEFÔNICA. 1) PRELIMINARES. 1.1) INCOMPETÊNCIA EM RAZÃO DA MATÉRIA.
ATRIBUIÇÃO DA JUSTIÇA FEDERAL. INOCORRÊNCIA. 1.2) INCOMPETÊNCIA ANTE A
COMPLEXIDADE DA CAUSA. IMPROCEDÊNCIA. 2) OBSERVÂNCIA DA REGULAMENTAÇÃO
DITADA PELA UNIÃO EM RELAÇÃO AO SERVIÇO TELEFÔNICO. TESE IMPROCEDENTE.
VIOLAÇÃO DOS DIREITOS DO CONSUMIDOR. 1. Tratando-se a demanda em questão
de ação individual, de interesse particular, não há necessidade do chamamento
da agência reguladora ANATEL para atuar como litisconsorte passivo, e
estando o objeto do feito adstrito à declaração da nulidade da cobrança
dos valores
lançados a título de "serviços locais", inexistindo qualquer
discussão acerca do contrato de concessão firmado entre a Administração
Pública e a empresa concessionária, não
há que se falar em incompetência da Justiça Estadual, quer pela qualidade
das partes, quer em razão da matéria. 2. Não
se cogita de afastamento da competência jurisdicional quando a solução da
causa não
é complexa, mas viável a partir da prova dos autos, máxime quando
desnecessária qualquer perícia. 3. O consumidor tem o direito à informação
adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação
correta de qualidade, quantidade, características, composição, qualidade
e preço (art. 6º, III, CDC; art. 3º, IV, Lei 9.427/97; art. 1º, Lei
Estadual 13.051/2001). Assim, mesmo que a conduta da empresa telefônica
esteja amparada por portaria expedida pelo Ministério das Comunicações,
revela-se ilegal a omissão de informações relevantes ao consumidor, tendo
em vista a hierarquia das normas. Precedentes jurisprudenciais. RECURSO
CONHECIDO E DESPROVIDO Do exposto, propõe-se o conhecimento e o
desprovimento do recurso inominado interposto por BRASIL TELECOM S/A,
mantendo-se a r. sentença recorrida, de lavra do eminente Juiz AMARILDO
CLEMENTINO SOARES, inclusive por seus próprios fundamentos (art. 46, in
fine, da LJE), condenando-se a recorrente ao pagamento das custas
processuais e honorários advocatícios devidos ao patrono da parte
recorrida, estes fixados em 20% (vinte por cento) sobre o valor atualizado
da causa, na forma preconizada no art. 55, segunda parte, da LJE. É o voto.
DECISÃO: Face ao exposto, acordam os Juízes integrantes da Turma Recursal
Única dos Juizados Especiais do Estado do Paraná, por unanimidade de votos,
em conhecer do recurso e, no mérito, negar-lhe provimento, nos termos do
voto do Relator.” – Recurso Inominado nº2004.0001868-9 – Juiz
Relator Dr. Edgard Fernando Barbosa – Livro 63, fls.208-218 – 01/11/2004
– Turma Recursal Única dos Juizados Especiais do Estado do Paraná “EMENTA
: TELEFONIA. "SERVIÇOS LOCAIS". AUSÊNCIA DE DISCRIMAÇÃO EM
FATURA TELEFÔNICA. NULIDADE DA COBRANÇA. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA.
RECURSO DESPROVIDO. EMBARGOS DECLARATÓRIOS. 1) OBSCURIDADE. NECESSIDADE DA
INTERVENÇÃO DA ANATEL NO FEITO. INOCORRÊNCIA. 2) OBSCURIDADE. NECESSIDADE
DE PRODUÇÃO DE PROVA PERICIAL. VÍCIO NÃO CONSTATADO. 3) OMISSÃO.
COMPETÊNCIA DA ANATEL PARA DEFINIR O MÉTODO DE TARIFAÇÃO. INEXISTÊNCIA.
4) VIOLAÇÃO AOS ARTS. 2º, 5º, II E 37, CAPUT, DA CF. TESE IMPROCEDENTE.
5) PREVISÃO DO MÉTODO DE MULTIMEDIÇÃO EM ATOS INFRALEGAIS. IRRELEVÂNCIA.
1. Inexiste obscuridade na decisão embargada na medida em que se consignou
expressamente que, tendo a presente lide se limitado à declaração de
nulidade do montante consignado na fatura telefônica como "serviços
locais", despicienda qualquer análise a respeito do contrato de
concessão firmado entre a embargante e a ANATEL, de modo que não
há que se falar em violação ao art. 109, inciso I, da Constituição
Federal, por não ser matéria de competência
da Justiça Federal. 2. Não há que se falar em
obscuridade quando o acórdão objurgado expôs claramente que, tendo a
controvérsia dos autos se limitado à declaração da nulidade da cobrança
dos valores
lançados nas faturas telefônicas do autor a título de "serviços
locais" em razão da falta de discriminação, desnecessária a realização
de prova pericial na medida em que para tanto basta a análise do direito
invocado pelo autor. E dispensável a prova pericial não
há que se falar em ofensa aos princípios constitucionais do contraditório
e da ampla defesa (art. 5º, inciso LV, da Constituição Federal). 3. Não
tendo a questão acerca da competência da ANATEL para definir o método de
tarifação das chamadas locais sido objeto de controvérsia nos autos, na
medida em que a lide se ateve à declaração da nulidade da cobrança dos
"serviços locais" não discriminados,
não
há que se falar em omissão do acórdão recorrido, tampouco em violação
aos dispositivos constitucionais e legais apontados pela embargante. 4.
Diversamente do sustentado pela embargante, o acórdão recorrido não
impôs novos parâmetros para a consignação das ligações locais nas
faturas telefônicas; apenas determinou que fosse observada a legislação
consumerista no que tange à especificação dos serviços. Desse modo,
inexiste a suscitada violação aos arts. 2º, 5º, inciso II e 37, caput,
da Constituição Federal. 5. É irrelevante para o deslinde da questão a
existência de autorização, em legislação infralegal, para a utilização
do sistema de multimedição (pulsos), na medida em que, não sendo especificadas as ligações
locais efetuadas pelo consumidor, há a violação de seus direitos
previstos na Lei nº 8.078/90. Dessa forma, desnecessária a manifestação
desta Turma Recursal a respeito de tal assunto, de modo que inexiste a omissão
suscitada. EMBARGOS DECLARATÓRIOS CONHECIDOS E REJEITADOS. Do exposto, propõe-se
o conhecimento e a rejeição dos embargos de declaração, consoante a
fundamentação supra-expendida. É o voto que se propõe. DISPOSITIVO Face
ao exposto, acordam os Juízes integrantes da Turma Recursal Única dos
Juizados Especiais do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em
conhecer dos embargos declaratórios e, no mérito, rejeitá-los, nos termos
do voto do relator.” – Embargos de Declaração Cível nº2004.0001868-9/1
– Juiz Relator Dr. Edgard Fernando Barbosa – Livro 70, fls.1-13 –
06/12/2004 – Turma Recursal Única dos Juizados Especiais do Estado do
Paraná Percebemos então, pelas razoes expostas, que a cobrança de valores não discriminados em fatura telefônica é manifestamente ilegal, devendo ser restituído os valores pagos em dobro pela concessionária, conforme é a seguir apresentado. DA RESTITUIÇÃO DOS VALORES PAGOS REFERENTES A COBRANÇA NÃO DISCRIMINADA EM FATURA TELEFÔNICA, EM DOBRO Uma
vez demonstrada a ilegalidade das referidas cobranças, há que ser aplicado
o Código de Defesa do Consumidor, isto porque assim dispõe seu artigo 42,
parágrafo único, in verbis: “Art.
42. Na cobrança de débitos, o consumidor inadimplente não será exposto a
ridículo, nem será submetido a qualquer constrangimento ou ameaça. Parágrafo
único. O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição
do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de
correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável.” Observe-se
que, sendo a cobrança de valores não discriminados na fatura ilegal, a
quantia cobrada é indevida. Ressalte-se ainda que o parágrafo único do
artigo supracitado abre uma exceção quanto a restituição em dobro, qual
seja, o erro justificável, o que não ocorre no presente caso, vez que a
concessionária sempre teve conhecimento da legislação, não cumprindo as
determinações legais conscientemente. Conclui-se
assim que qualquer alegação de erro justificável irá contra o princípio
esculpido na Teoria Geral do Direito de que ninguém pode se beneficiar de
sua própria torpeza. Neste
sentido, trazemos: “EMBARGOS
DE TERCEIRO – Penhora. Alegação de que a transferência da propriedade
ao executado deu-se por ato simulado. Descabimento. Artigo 104 do Código
Civil. Regra cujo fundamento é o princípio moral que não admite
prevalecer-se alguém de seu próprio ato ilegal, pois a ninguém é
admitido alegar a própria torpeza. Simulação maliciosa equiparável
ao dano configurada, mantida a indenização em razão do reconhecimento da
litigância de má-fé. Ação improcedente. Recurso improvido”.grifo nosso - 1º TACSP – AP 0808688-2 – (34405)
– São Paulo – 5ª C. – Rel. Juiz Álvaro Torres Júnior – J.
23.02.2000) Desta
forma está cabalmente demonstrado não ser o presente caso contemplado pela
exceção prevista no parágrafo único do artigo 42 do Código de Defesa do
Consumidor. Deve
então a concessionária restituir os valores pagos em dobro, vejamos: “EMENTA
: REPETIÇÃO DE INDÉBITO. RESTITUIÇÃO EM DOBRO.
PARÁGRAFO ÚNICO DO ARTIGO 42 DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. JUROS DE
MORA. DATA INICIAL. CITAÇÃO. 1. Havendo cobrança indevida, aplicável
o parágrafo único do artigo 42 do Código de Defesa do Consumidor, que
determina a restituição
em dobro.
2. Os juros de mora incidem desde a data da citação, conforme prescrito no
artigo 405 do Código Civil vigente. Recurso parcialmente provido. Condeno a
recorrente ao pagamento das custas processuais e nos honorários advocatícios,
que fixo em 15% sobre o valor da condenação.Decisão: ACORDAM os Juízes
da Turma Recursal Única dos Juizados Especiais Cível e Criminal do Estado
do Paraná, por unanimidade de votos, em dar provimento parcial ao recurso,
na forma acima explicitada.”grifo
nosso – Recurso Inominado nº 2004000233-6 – 13/09/2004 – Juiz Relator
ucimar Novochadlo – Turma Recursal Juiz.Esp.Paraná Importante
ainda analisar o que nos traz o Código de Defesa do Consumidor em relação
à decadência, hipótese prevista em seu artigo 26. “Art.
26. O direito de reclamar pelos vícios aparentes ou de fácil constatação
caduca em: (...)”
– grifo nosso Existem
decisões dos tribunais que entendem ser este o artigo aplicável para que
se peça a restituição em dobro dos valores pagos e não discriminados na
fatura, resultando na devolução dos valores referentes aos últimos
noventa dias. Neste
sentido, trazemos algumas decisões proferidas no Tribunal de Justiça do
Rio de Janeiro, vejamos:
Com
todo respeito a posição adotada pela Turma Recursal do Juizado Especial Cível
do estado do Rio de Janeiro, ouso descordar. Note-se
que o caput do artigo 26 do Código de Defesa do Consumidor trata de vícios
aparentes ou de fácil constatação. É óbvio que perceber que
existem valores que não vem discriminados em fatura telefônica é de fácil
constatação para o consumidor, no entanto a questão não pode ser
apreciada por este prisma. Há que se entender que a constatação deve ser
da ilegalidade desta modalidade de cobrança. É
notório que não é de fácil constatação para o consumidor que a falta
de discriminação de valores na fatura telefônica é ilegal. Isto porque
tal constatação se torna ainda mais difícil ao consumidor, pois sempre
que a concessionária é consultada, afirma agir de acordo com disposição
da ANATEL, sendo a cobrança por pulsos, sem qualquer discriminação,
supostamente correta. Neste
caso a fácil constatação é sim da concessionária, que mesmo tendo total
conhecimento da legislação vigente, sabendo que quaisquer determinações
da ANATEL não poderão desrespeitar a Lei ou quiçá ter força maior,
continua efetuando a cobrança de maneira ilegal. Portanto,
o prazo a ser aplicado é o que está disposto no artigo 27 do Código de
Defesa do Consumidor, in verbis: “Art.
27. Prescreve em 5 (cinco) anos a pretensão à reparação pelos danos
causados por fato do produto ou do serviço prevista na Seção II deste Capítulo,
iniciando-se a contagem do prazo a partir do conhecimento do dano e de sua
autoria.” Faz-se
imprescindível observar o que nos traz o artigo 14, parágrafo 1º, inciso
I, incluso na Seção II do código consumerista: “Art.
14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de
culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos
relativos à prestação dos serviços, bem como por informações
insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos. §1º
O serviço é defeituoso quando não fornece a segurança que o consumidor
dele pode esperar, levando-se em consideração as circunstâncias
relevantes, entre as quais: I
– o modo de seu fornecimento;” Desta
forma, pelas razões expostas, há que ser aplicada a prescrição prevista
no artigo 27 do C.D.C. (ou seja, a devolução dos valores pagos pelos últimos
cinco anos, em dobro), vez que a concessionária sempre teve conhecimento de
sua omissão, arbitrariedade e ilegalidade em relação às faturas telefônicas,
não sendo tal fato de fácil conhecimento do consumidor, que ao consultar a
própria empresa, afirma que age de acordo com as normas estipuladas pela
ANATEL, impedindo que o consumidor possa conferir o que vem sendo gasto,
obrigando-o a sujeitar-se aos valores cobrados para que não tenha o serviço
interrompido. DA
COMPETÊNCIA PARA O JULGAMENTO DAS QUESTÕES REFERENTES AOS VALORES NÃO
DISCRIMINADOS EM JUÍZO Insistentemente
a concessionária alega, em matéria de defesa, nos mais diversos processos
que sofre, a incompetência da justiça estadual em razão da alegação de
que a ANATEL - AGÊNCIA NACIONAL DE TELECOMUNICAÇÕES é litisconsórcio
passivo necessário, o que transferiria a competência para a Justiça
Federal. No
entanto tal argumentação não merece prosperar uma vez que a ANATEL possui
apenas o dever de fiscalização do serviço de telefonia, não sendo
responsável pelos serviços e tarifas. Neste
sentido, trazemos: “DECISAO: A NONA CAMARA CIVEL DO TRIBUNAL DE JUSTICA DO ESTADO DO
PARANA, POR UNANIMIDADE DE VOTOS, NEGA PROVIMENTO AO RECURSO, NA FORMA DO
VOTO DO RELATOR. EMENTA: PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. ACAO
AJUIZADA PELA AGRAVADA DISCUTINDO IRREGULARIDADES NA COBRANCA DE SERVICO DE
TELEFONIA (LIGACOES LOCAIS) PRELIMINAR DE CARENCIA DE ACAO REJEITADA.
PRETENDIDA INCLUSAO DA ANATEL (AGENCIA NACIONAL DE TELECOMUNICACOES) NO POLO
PASSIVO DA DEMANDA. DESACOLHIMENTO. INVERSAO DO ONUS DA PROVA. POSSIBILIDADE.
HIPOSSUFICIENCIA TECNICA CARACTERIZADA. ALEGACAO DE INCOMPETENCIA DO JUIZO
ESTADUAL AFASTADA. 1. AS CONDICOES DA ACAO SAO ANALISADAS SEGUNDO O QUE E
AFIRMADO PELA PARTE AUTORA NA PETICAO INICIAL. ASSIM, SE HA ALEGACAO DE
IRREGULARIDADE OU ILEGALIDADE NA COBRANCA DAS TARIFAS TELEFONICAS E O
ORDENAMENTO JURIDICO NAO PRE-EXCLUI A APRECIACAO DA PRETENSAO PELO PODER
JUDICIARIO, NAO HA QUE SE FALAR EM IMPOSSIBILIDADE JURIDICA DO PEDIDO. 2.
A AGENCIA NACIONAL DE TELECOMUNICACOES (ANATEL) NAO E RESPONSAVEL POR
SERVICOS E TARIFAS, TENDO APENAS O DEVER DE FISCALIZAR AS CONCESSIONARIAS,
RAZAO PELA QUAL NAO SE JUSTIFICA A FORMACAO DE LITISCONSORCIO PASSIVO
NECESSARIO E O DESLOCAMENTO DA ACAO PARA A JUSTICA FEDERAL. 3. OS
REQUISITOS AUTORIZADORES DA INVERSAO DO ONUS DA PROVA EM FAVOR DO CONSUMIDOR
SAO AFERIDOS DE ACORDO COM AS REGRAS ORDINARIAS DA EXPERIENCIA, A CRITERIO
DO CONDUTOR DO PROCESSO, NAO HAVENDO NECESSIDADE DE COMPROVACAO (ART. 6..,
VIII, CDC). RECURSO DESPROVIDO”- GRIFO NOSSO – Processo nº172125300 – Origem: 8ª Vara Cível
de Curitiba – Acórdão nº530 – 9ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça
do Estado do Paraná – Relator Ruy Cunha Sobrinho – 31/03/2005 “EMENTA
: TELEFONIA. "SERVIÇOS LOCAIS". AUSÊNCIA DE DISCRIMAÇÃO EM
FATURA TELEFÔNICA. NULIDADE DA COBRANÇA. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA.
RECURSO DESPROVIDO. EMBARGOS DECLARATÓRIOS. 1) OBSCURIDADE. NECESSIDADE DA
INTERVENÇÃO DA ANATEL NO FEITO. INOCORRÊNCIA. 2) OBSCURIDADE. NECESSIDADE
DE PRODUÇÃO DE PROVA PERICIAL. VÍCIO NÃO CONSTATADO. 3) OMISSÃO. COMPETÊNCIA
DA ANATEL PARA DEFINIR O MÉTODO DE TARIFAÇÃO. INEXISTÊNCIA. 4) VIOLAÇÃO
AOS ARTS. 2º, 5º, II E 37, CAPUT, DA CF. TESE IMPROCEDENTE. 5) PREVISÃO
DO MÉTODO DE MULTIMEDIÇÃO EM ATOS INFRALEGAIS. IRRELEVÂNCIA. (...) 3. Não
tendo a questão acerca da competência da ANATEL para definir o método de
tarifação das chamadas locais sido objeto de controvérsia nos autos, na
medida em que a lide se ateve à declaração da nulidade da cobrança dos
"serviços locais" não
discriminados,
não há que se falar em
omissão do acórdão recorrido, tampouco em violação aos dispositivos
constitucionais e legais apontados pela embargante...”
– GRIFO NOSSO. Recurso 2004.0001868-9/1 -
Embargos de Declaracao Cível - Ação Originária 2003.325 - Comarca de
Origem Santo Antonio da Platina – JECl - Juiz Relator EDGARD FERNANDO
BARBOSA – Livro 70, folha 1-13 - Data do Julgamento 06/12/2004 - Turma
Recursal Única dos Juizados Especiais do Estado do Paraná Assim,
resta claro e indene de dúvidas que a competência para julgamento da
demanda será da Justiça Estadual. CONCLUSÃO Não
restam dúvidas de que a cobrança de valores não discriminadas em fatura
telefônica é ilegal, devendo ser devolvida em dobro pelas concessionárias
que a cobram. Para isso é necessário que os consumidores busquem seus
direitos! É
necessário que as empresas cumpram as determinações legais, o que também
é exigido de todos nós, cidadãos. Conforme
também foi apresentado, existem divergências em relação ao período em
que a concessionária devera devolver os valores cobrados e não
discriminados, sendo veementemente defendida a posição de que deverão ser
devolvidos os valores pagos pelos últimos cinco anos, em dobro. Por
esta razão os consumidores precisam exigir seus direitos, pois este é o
caminho que leva a evolução dos serviços, das Leis e do próprio
ordenamento jurídico. Este é o caminho da JUSTIÇA! Espera-se
ainda terem ficados esclarecidas as razões de fato e de direito que
demonstram ser ilegal a cobrança imposta, bem como qual a justiça
competente para julgamento das inúmeras ações que vêm sendo impetradas
em face das concessionárias. [1] Comentários à Constituição do Brasil, São Paulo: Saraiva, 1988, v. 1, p. 425 [2] REALE, Miguel. A boa-fé objetiva. Estado de São Paulo, 16 de ago. 2003, Espaço Aberto, p. A2 [3] “Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais realtivas ao fornecimento de produtos e serviços que: IV – estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa fé ou a eqüidade;” [4] “Art. 113. Os negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a boa-fé e os usos do lugar e sua celebração.” FÁBIO
SILVEIRA ROCHA ADVOGADO
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